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Após repúdio, Lira altera comissão que investigará crise Yanomami

Por Panoramams em 23/05/2024 às 15:56:18

A criação da uma comissão externa da Câmara dos Deputados para investigar a crise humanitĂĄria na Terra Yanomami provocou indignação entre os indĂ­genas. Segundo a nota de repĂșdio divulgada no inĂ­cio da semana por diferentes entidades que representam os povos da região, os deputados originalmente designados são contra a demarcação de terras e defendem pautas que atacam os direitos das populações indĂ­genas. Diante da mobilização, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP), decidiu, nesta quarta-feira (22), incluir Célia XakriabĂĄ (PSOL) como membro da comissão.

Com a nova nomeação, serão 16 integrantes. "Fui a primeira parlamentar a visitar o território em 2023 para acompanhar a gravĂ­ssima crise, causada pelo aumento de 54% do garimpo ilegal e pelo genocĂ­dio incentivado pelo governo [Jair] Bolsonaro. Seria, no mĂ­nimo, ilógico que eu não fizesse parte da comissão", manifestou Célia XacriabĂĄ nas redes sociais.

A comissão externa foi criada por meio de ato da presidĂȘncia da Câmara dos Deputados, assinado por Lira em 13 de maio. O documento é sucinto. Menciona apenas que o objetivo é acompanhar as autoridades competentes na investigação e apuração da crise humanitĂĄria dos yanomami.

Surucucu, na Terra IndĂ­gena Yanomami - Foto: Fernando Frazão/AgĂȘncia Brasil

Sob coordenação da deputada Coronel Fernanda (PL), a comissão farĂĄ sua primeira reunião no dia 5 de julho, quando deverĂĄ ser aprovado o plano de trabalho. Além da recém-nomeada Célia XacriabĂĄ, outra indĂ­gena integrarĂĄ os trabalhos, Silvia Waiapi (PL). Ela foi secretĂĄria de SaĂșde IndĂ­gena do Ministério da SaĂșde, durante o governo de Jair Bolsonaro.

"Manifestamos nosso repĂșdio e indignação por mais uma ação truculenta da Câmara dos Deputados que, longe de manifestar preocupação e compromisso com nosso povo, pretende utilizar a dor e a morte do povo Yanomami e Ye'kwana para objetivos simulados de disputas polĂ­ticas e de defesa do garimpo e da mineração em territórios indĂ­genas", diz o texto divulgado na segunda-feira (20) por quatro entidades, a Hutukara Associação Yanomami (HAY), Urihi Associação Yanomami (URIHI), Associação Parawami Yanomami (Parawami) e a Associação Wanasseduume Ye'kwana (Seduume). Outras 78 organizações sociais subscreveram a nota.

Todos os 15 parlamentares designados inicialmente votaram a favor da tese do Marco Temporal, segundo a qual os povos indĂ­genas somente teriam direito à demarcação de terras que estavam ocupadas por eles na data da promulgação da Constituição de 1988. O PL, mesmo partido do ex-presidente da RepĂșblica Jair Bolsonaro, tem sete integrantes. Os demais são do União Brasil, MDB e Republicanos.

Garimpo ilegal no rio MucajaĂ­, Terra IndĂ­gena Yanomami - Foto: Fernando Frazão/AgĂȘncia Brasil

Embora considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em setembro de 2023, a tese do Marco Temporal foi aprovada dias depois no Congresso. O presidente Luiz InĂĄcio Lula da Silva vetou a medida, mas o veto foi posteriormente derrubado pelos parlamentares e a Lei Federal 14.701/2023 foi promulgada. Questionamentos sobre a constitucionalidade de lei devem forçar uma nova discussão no STF.

As entidades signatĂĄrias da nota avaliam que a criação da comissão "só pode ser entendida como um escĂĄrnio e uma afronta ao sofrimento dos povos indĂ­genas". Elas também alegam que nenhum dos 15 parlamentares inicialmente designados se mobilizou alguma vez em apoio às populações indĂ­genas.

A Terra Yanomami ocupa mais de 9 milhões de hectares e se estende pelos estados de Roraima e do Amazonas. É a maior reserva indĂ­gena do paĂ­s. Os resultados do Censo 2022 divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e EstatĂ­stica (IBGE) apontam que mais de 27 mil indĂ­genas vivem nessa ĂĄrea.

Em janeiro do ano passado, a repercussão da crise humanitĂĄria vivenciada nessas aldeias provocou uma comoção nacional. Segundo dados do Ministério dos Povos IndĂ­genas, apenas em 2022 morreram 99 crianças yanomami com menos de 5 anos, na maioria dos casos por desnutrição, pneumonia e diarreia.

Mulheres e crianças Yanomami, em Surucucu - Foto: Fernando Frazão/AgĂȘncia Brasil

Então recém-empossado, o governo do presidente Luiz InĂĄcio Lula da Silva anunciou uma série de ações governamentais, incluindo o combate ao garimpo ilegal, apontado como causa central da situação, junto à omissão do Estado. No entanto, passados mais de um ano, as atividades clandestinas continuam ocorrendo no território.

Na nota, as entidades solicitaram que o JudiciĂĄrio declare a inconstitucionalidade da Lei Federal 14.701/2023. Também cobram do governo a intensificação de ações contra o garimpo e o fortalecimento do atendimento de saĂșde aos povos da região. Por fim, reivindicam que o Poder Legislativo respeite os territórios yanomami e cesse "sua ofensiva imoral contra os direitos dos povos indĂ­genas".

Procurados pela AgĂȘncia Brasil, nem a presidĂȘncia da Câmara dos Deputados e nem o gabinete do deputado Arthur Lira se manifestaram.

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